Eu estava preparada para não enviar nada hoje. Por motivos de força maior. O temporal que atingiu Niterói na quinta-feira à noite me deixou sem energia – em todos os sentidos. Por quase 24 horas. O estrago no meu bairro foi feio: árvores centenárias foram arrancadas pela raiz, derrubaram a fiação, bloquearam a via, nenhum carro entrava ou saía. Descobri que a rajada de vento que devastou a cidade é chamada pelos meterologistas de microburst, microexplosão.
Cancelei uma comemoração de aniversário (pois é, tinha decidido celebrar tardiamente) e passei a sexta-feira esperando a luz voltar, em agonia (moro no décimo andar, fiz compras de mês na semana). Não tinha lugar pra escrever nesse desespero. Mas recorri ao diário, de qualquer forma. Quando terminei de escrever, por volta das 17h, a luz voltou.
Luz
No começo de tudo
havia a luz
depois de tudo
ainda haverá luz?poema do meu livro “É na cacofonia que eu me escuto”
Nesse ínterim, outra força maior se articulava. Na quarta-feira, as escritoras do Coletivo Escreviventes, no qual me incluo, decidiram fazer uma rifa de livros para custear nossa presença na Festa Literária Internacional de Paraty que já se aproxima. Fomos pela primeira vez no ano passado, nos organizamos no improviso, cerca de 20 mulheres na cara e na coragem de expor sua literatura no evento mais importante do país. Foi um arraso. Escrevi sobre nossa participação lá na página do Coletivo.
Agora seremos quase o dobro de mulheres e talvez tenhamos mais que uma mesa e duas cadeiras para marcar nossa presença. Mais preparativos são necessários. Por isso a rifa. Porém, o prazo era curto: só tínhamos até sexta pra topar essa parada.
Enquanto a minha luz se apagava, outra luz se acendia e multiplicava. Enquanto eu economizava a bateria do celular, minhas colegas não poupavam esforços para divulgar nossa iniciativa em todos os grupos e redes sociais que fazem parte, postando vídeos e tudo mais. Eu também fiz minha parte antes da luz se apagar, mobilizei meus contatos como pude. Depois, impotente diante da força maior, fiquei de espectadora. E o que eu vi acontecer iluminou meus momentos mais sombrios desses dois dias.
Batemos a meta. Em tempo recorde. Os apoios vieram do Brasil inteiro e de fora, de escritores e leitores, de jornalistas que divulgaram nossa iniciativa, de amigos e parentes. Todo mundo colaborou. Todo mundo quer nos ver brilhar na Flip mais uma vez. E brilharemos.
E por falar em Flip, já foram anunciados os autores internacionais e nacionais que participarão da vigésima edição da festa, que homenageia Pagu e terá Augusto de Campos como artista em destaque. Eu estarei lá com o Coletivo Escreviventes e com um livro novo – mais novidades sobre isso em breve!
Na quarta-feira, fez sol. Depois de vários dias, fez sol. Saí para percorrer o bairro e relaxar os olhos na beira do mar. O passeio que gostaria de ter feito no meu aniversário, se não tivesse chovido. Subi a rampa vermelha do museu do Niemeyer e mergulhei na exposição de fotografias das ondas gigantes de Nazaré do fotógrafo português Ricardo Bravo. Fiquei um tempo olhando as ondas na galeria escura e refrigerada artificialmente.
Depois, saí para a luz quente do meio-dia e para a brisa leve que soprava. Fiquei um tempo olhando as ondas calmas que quebravam nas pedras e contando as tartarugas visíveis na água cristalina, a tantos metros de altura. Você consegue ver as tartarugas?
Lembro sempre de um poema de Mar Becker quando paro para olhar o mar:
o que pedimos ao mar quando o olhamos por
muito tempoé que nos leve embora
os olhosMar Becker, notas de caminho, excertos reunidos, "do mar"; 2023
Não entendo o que ela diz. Na verdade, não faço esforço para entender. O que eu peço quando olho o mar por muito tempo é que o mar me invada os olhos. Me engula e me faça mar. Me faça parte dessa força maior que envolve tudo e um dia nos engolirá. Sem dó.
Agradecimentos 💕
Tive um aniversário sereno e feliz. Recebi muito carinho ao longo do dia chuvoso, especialmente de vocês que me leem, muitos e muitas que ainda nem conheço pessoalmente. Muito obrigada. Vocês realmente fizeram meu dia especial.
E obrigada aos leitores e amigos
, e que me enviaram mimos em forma de livros para rechear minhas referências e estantes (para o desespero da minha mãe).O que eu li essa semana 📚
Com links para a Amazon que me geram uns trocados por compras
O mapa do céu na terra, Carla Miguelote. Plaquete de poesia enviada pelo Círculo de Poemas em agosto.
A ilha das afeições, Patricia Lino. Plaquete de poesia enviada pelo Círculo de Poemas em setembro.
Um teto todo seu, Virginia Woolf.
Sal de fruta, Bruna Beber. Plaquete de poesia enviada pelo Círculo de Poemas em outubro.
O que eu assisti essa semana 📺
Com links para o Letterboxd. Me segue lá: Lulumilk ;)
Pérola, no cinema. Drica Moraes esplendorosa no filme baseado na peça de Mauro Rasi e dirigido por Murilo Benício.
Saída à francesa, no Prime Video.
The wonderful story of Henry Sugar e The Swan, dois curtas do Wes Anderson baseados em histórias do Roald Dahl, na Netflix.
A terceira temporada de Ozark, na Netflix.
Ownnnn agora que vi meu nome aqui! Tô atrasada nas leituras. Tomara que vc goste muito!
"Saí para percorrer o bairro e relaxar os olhos na beira do mar."
Essa frase me tocou. Tudo o que eu queria agora era poder relaxar os olhos contemplando as ondas do mar.
Que delicia de texto!